Patricia Arquette, vencedora do Oscar 2015 na categoria melhor atriz coadjuvante, fez do seu discurso de agradecimento, no último domingo, uma plataforma para chamar a atenção para um tema muito importante: a igualdade de gêneros no mundo do trabalho. Dizer que a mulher conquistou seu lugar no mercado já não é novidade para ninguém. Mas há nuances. Hoje, 46% da população economicamente ativa no Brasil é composta por mulheres. Mas, quando o assunto é salário, elas ainda recebem menos que os homens. O desdobramento dos dados do Censo 2010, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) mostra que elas ganham 68% do salário masculino.
Outro aspecto que chama a atenção no mundo do trabalho é o fato de existirem poucas mulheres líderes. Segundo levantamento da consultoria Grant Thornton, que falou com executivos de 12,5 mil empresas em 44 países (no Brasil participaram 300 companhias), as mulheres ocupam 24% dos cargos de liderança no mundo. No Brasil, elas ocupam 23% da alta gestão – número similar à média mundial – e 14% quando se refere somente a presidentes.
Além disso, estudos recentes feitos na Alemanha e também na Austrália concluíram que há um impacto financeiro positivo quando há diversidade de gênero, por exemplo, no conselho de administração. As executivas também descobrem que ter rostos femininos em volta da mesa de reuniões pode alterar as interações, tanto formais como informais. E isso é positivo para consumidores, acionistas e parceiros comerciais, enfim, todos os stakeholders das empresas.
Então por que ainda o percentual de empresas com diversidade de gênero nas lideranças é tão pequeno? Acredito que um dos motivos seja as próprias mulheres que, muitas vezes, não queiram assumir posições de liderança. Isso porque, na visão delas, o modelo hoje vigente nas organizações dificulta a conjugação da vida pessoal com a profissional.
Pessoalmente, embora reconheça algumas dificuldades, acho possível unir e equilibrar os dois lados. Sou realizada como mãe, esposa e profissional. Quando questionada sobre como conseguir contrabalancear a vida pessoal e profissional, costumo dizer que não há uma fórmula única. Cada pessoa deve procurar o seu próprio caminho e reavaliá-lo na medida em que as prioridades da vida mudam. Independentemente do modelo, porém, é importante ter foco, ou seja, buscar aquilo que realmente importa,ter maior tolerância para as ‘imperfeições’ e abandonar o sentimento de culpa. Mães em especial costumam sentirem-se culpadas: seja pela suposta ausência que o trabalho fora de casa traria ou pela falta de exemplo que a ausência de se ter um trabalho fora de casa causaria.
Curiosamente, essa demanda de equilíbrio comumente atribuída ao gênero feminino hoje parece não ser exclusividade delas. As gerações mais jovens têm valorizado o bom senso na conjugação da vida pessoal e profissional. Artigos de conceituadas faculdades americanas de administração de empresas demonstram maior eficiência das organizações nas quais os colaboradores têm melhor equilíbrio de suas energias física, mental, intelectual e espiritual.
Esse cenário é uma clara indicação de que aquilo a que chamo de modelo preponderante de liderança na atualidade pode não ser sustentável para as próprias organizações, seja em termos econômicos, seja na atração e retenção de talentos – homens e mulheres – que cada vez mais valorizam a qualidade de vida. E a mulher, que já de longa data assumiu essa necessidade, pode ser um importante agente de transformação na inevitável mudança desse modelo de liderança.
*Suzana Fagundes
Diretora Jurídica e de Relações Institucionais da ArcelorMittal Brasil e fundadora da associação WILL (WomenLeadership in LatinAmerica) que promove desenvolvimento de lideranças femininas